Reflexão do Evangelho

Os pobres podem contar com deus e têm futuro!

Reflexão do Evangelho de Lucas 6, 17-26

Leia a reflexão sobre Lucas 6, 17-26, texto de Itacir Brassiani

Escutando atentamente o Evangelho deste domingo, não podemos contornar uma outra pergunta, tão importante como a pergunta pela vida após a morte: os pobres e oprimidos têm futuro, já que a opressão e a escravidão teimam em não desaparecer e, com o passar dos séculos, vêm se maquiando e reciclando? Revoluções feitas em nome dos oprimidos, aos poucos esquecem suas promessas e se fecham em torno dos interesses de uma nova classe hegemônica. O próprio cristianismo, que lança suas raízes nas esperanças dos pobres e oprimidos, caiu na tentação da fuga na tranquilidade do culto e na segurança da doutrina.

No breve texto do Evangelho que ouvimos hoje, Jesus retoma sua pregação inaugural na sinagoga de Nazaré. Depois de colher trigo em propriedade alheia e em dia de sábado e de curar um homem que tinha uma mão paralisada, depois de retirar-se para rezar e de constituir uma comunidade de discípulos, Jesus é cercado por uma numerosa multidão, profundamente necessitada de ajuda. É neste contexto que ele ensina seus discípulos, definindo claramente quem é feliz e pode contar com Deus e quem dá as costas a Deus e caminha para uma vida frustrada. E ele fala com a força e a autoridade do próprio Deus.

Para Jesus, os pobres e oprimidos podem sempre contar com Deus, e, por isso têm futuro. Às pessoas sem segurança material e social, tratadas como últimas nos projetos políticos, famintas e sofredoras, Jesus não promete riquezas, mas afirma: “Felizes vós, os pobres, porque vosso é o Reino de Deus! Sereis saciados! Havereis de rir!” E esta esperança não engana, porque o próprio Jesus veio, como intuiu Maria, para mostrar a força do braço de Deus, para dispersar os orgulhosos, derrubar os poderosos, exaltar os humildes e beneficiar os famintos (cf. Lc 1,51-53); e porque ele reúne, forma e envia discípulos e discípulas para continuarem sua ação.

E os ricos e opressores têm um futuro, merecem nossa admiração? O peso dos fatos quase nos obriga a crer que os ricos e poderosos sempre têm a última palavra, riem por último, riem melhor. “Eles confiam na sua força e se orgulham da sua grande riqueza” (Sl 49,7). Mas, para Jesus, eles já escolheram sua consolação e, permanecendo indiferentes e violentos, se auto excluem do banquete do Reino. “Mas ai de vós, ricos, porque já tendes vossa consolação! Ai de vós que agora estais rindo, porque ficareis de luto e chorareis!” Com a parábola do pobre Lázaro e do rico anônimo (cf. Lc 16,19-31), Jesus não deixa dúvidas sobre isso.

Não se trata de revanchismo barato, mas de justiça de Deus. Deus trata as pessoas e governa o mundo seguindo o critério da necessidade concreta, e não do mérito. E Jesus leva isso à radicalidade, começando pela inclusão dos ‘últimos’. Nenhuma concessão aos ricos, famosos e poderosos. Para o Evangelho, a felicidade que não fere e não é roubada é aquela que se enraíza na fidelidade a Jesus de Nazaré e nos engaja na sua missão, a assumir, se for o caso, o ódio e os insultos que isso traz. Beatos e felizes são os mártires, cuja caravana exultante e jubilosa atravessa os séculos e provoca instabilidade nos poderes e igrejas.

Jesus delimita muito bem o caminho e o lugar daqueles/as a quem chama a seguir seus passos. Precisamos granjear fama e honra a qualquer preço, mesmo que seja o alto preço do silêncio diante dos opressores? “Ai de vós quando todos falarem bem de vós, pois era assim que seus antepassados tratavam os falsos profetas.” A profecia e a perseguição são sinais inequívocos da fidelidade a Jesus Cristo. “Pois era assim que os seus antepassados tratavam os profetas.” Eles são como árvores plantadas à beira do rio: suas folhas não murcham, e dão frutos no tempo certo. Há esperança para sua descendência! (cf. Jr 31,17)

Jesus de Nazaré, missionário intrépido do Pai: a caravana dos homens e mulheres de boa vontade, que transforma a possibilidade de um outro mundo possível em realidade se manifesta em nossas comunidades cristãs, mas as ultrapassa por todos os lados. Ajuda-nos a tomar consciência de que este mundo está sendo gestado, que somos chamados a ajudar no seu parto, que nisso reside a verdadeira felicidade, aquela alegria profunda e verdadeira que ofusca as ameaças advindas das pandemias e da apoteose dos vencedores de plantão. Assim seja! Amém!

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