Leia a reflexão sobre João 20,19-23, texto de José Antonio Pagola.
Boa leitura!
Há alguns anos, o grande teólogo alemão Karl Rahner atrevia-se a afirmar que o principal e mais urgente problema da Igreja do nosso tempo era a sua “mediocridade espiritual”. Estas eram as suas palavras: o verdadeiro problema da Igreja é “continuar com uma resignação e um tédio cada vez maior pelos caminhos habituais de uma mediocridade espiritual”. E espiritualidade é deixar-se conduzir pelo Espírito que Jesus sopra em nossos corações (Jo 20,22). É viver como novas criaturas animadas pelo Espírito, tal como o sopro de Deus na criação da humanidade (Gn 2,7).
O problema tem-se agravado nestas últimas décadas. De pouco serviram as tentativas de reforçar as instituições, salvaguardar a liturgia ou vigiar a ortodoxia. No coração de muitos cristãos, está-se a apagar a experiência interior de Deus.
A sociedade moderna apostou no “exterior”. Tudo nos convida a viver desde fora. Tudo nos pressiona para nos movermos depressa, sem pararmos em nada nem em ninguém. A paz já não encontra resquícios para penetrar até ao nosso coração. Vivemos quase sempre na crosta exterior da vida. Estamos esquecendo o que é saborear a vida a partir de dentro. Para que a vida seja humana, falta-lhe hoje uma dimensão essencial: a interioridade.
É triste observar que tampouco nas comunidades cristãs sabemos cuidar e promover a vida interior. Muitos não sabem o que é o silêncio do coração, não se ensina a viver a fé desde dentro. Privados de experiência interior, sobrevivemos esquecendo a nossa alma: escutando palavras com os ouvidos e pronunciando orações com os lábios enquanto o nosso coração está ausente.
Na Igreja, fala-se muito de Deus. Mas, onde e quando escutamos a presença silenciosa de Deus no mais fundo do nosso coração? Onde e quando acolhemos o Espírito do Ressuscitado no nosso interior? Quando vivemos em comunhão com o Mistério de Deus desde dentro?
Acolher a Deus no nosso interior quer dizer pelo menos duas coisas. A primeira: não colocar Deus longe e fora de nós, isto é, aprender a escutá-lo no silêncio do coração. A segunda: descer Deus da nossa cabeça até ao profundo do nosso ser, isto é, deixar de pensar em Deus só com a mente e aprender a percebê-lo no mais íntimo de nós.
Esta experiência interior de Deus, real e concreta, pode transformar a nossa fé. Surpreendemo-nos de como temos podido viver sem descobri-la antes. É possível encontrar Deus dentro de nós no meio de uma cultura secularizada. É possível também hoje conhecer uma alegria interior nova e diferente. Mas parece-me muito difícil manter por muito tempo a fé em Deus no meio da agitação e frivolidade da vida moderna sem conhecer, mesmo que seja de forma humilde e simples, alguma experiência interior do Mistério de Deus.