Direitos Humanos

ONU encerra missão no Haiti comandada pelo Brasil

A Organização das Nações Unidas (ONU) encerrou oficialmente neste domingo (15) a Missão de Estabilização no Haiti (Minustah), que será substituída por uma nova operação. A Missão das Nações Unidas de Apoio à Justiça no Haiti (Minujusth) contará com um número menor de integrantes e terá como objetivo apoiar o fortalecimento das instituições públicas e o Estado de Direito no país.

Com a realização de eleições em 2016 e o início de uma nova gestão na Presidência, sob o comando do empresário Jovenel Moise, empossado neste ano, a nova missão terá como foco apoiar o fortalecimento das instituições do país, do Executivo ao Judiciário.

O encerramento da Minustah foi aprovado pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas em 13 de abril deste ano. A decisão incluiu um período de seis meses para redução gradual da presença da missão e de seus integrantes no país. A resolução foi aprovada a partir de um relatório da Secretaria-Geral da ONU divulgado em março.

De acordo com o relatório, o Haiti atingiu um marco em seu processo de estabilização com a conclusão pacífica do processo eleitoral e o retorno da ordem constitucional em 7 de fevereiro passado. “O sucesso das eleições e a transição suave de poder a um novo presidente mostram a maturidade das instituições haitianas e o crescente compromisso dos agentes políticos e sociais com a resolução de diferenças pelo diálogo e pelos canais legais”, afirma o texto.

Libertadores ou ocupantes?

Para recapitular: após o golpe contra o presidente Jean-Bertrand Aristide, no início de 2004, o Haiti esteve ameaçado pelo caos. Por iniciativa dos EUA, que temiam um êxodo em direção ao norte, o Conselho de Segurança da ONU enviou 6.700 capacetes azuis, 1.600 policiais e 1.700 civis e diplomatas para apoiar o governo de transição, garantir a paz e organizar novas eleições.

Mas apesar disso, ou precisamente por causa do grande contingente, a Minustah enfrentou dificuldades desde o início. “Desde seu começo, em junho de 2004, a presença da Minustah no Haiti tem sido problemática, causando até mesmo divisão” na sociedade, escrevem Jorge Heine e Andrew S. Thompson na introdução de seu livro Fixing Haiti (Estabilizando o Haiti, em tradução livre)O cientista político canadense Nicolas Lemay-Hébert, da Universidade de Birmingham, no Reino Unido, acrescenta que muitos haitianos viram a Minustah como uma ocupação internacional.

Se inicialmente tratava-se de algo intuitivo, os opositores da missão encontraram logo razões para sua a desconfiança, principalmente após um acontecimento, alguns meses após o início da operação, na favela Cité Soleil, na periferia de Porto Príncipe. Capacetes azuis sob liderança brasileira teriam cometido atos brutais contra gangues criminosas, mas também contra partidários do presidente deposto e até mesmo contra pessoas que não estavam envolvidas. “Esse incidente continua muito presente quando os haitianos criticam a ONU”, afirma Lange.

No decorrer da missão, uma série de escândalos alimentou a desconfiança. Há vários casos de soldados da ONU que comprovadamente participaram de estupros e abusos sexuais de cidadãos haitianos e na prostituição de menores de idade. “Cada escândalo reforçou a narrativa de um Haiti ocupado e a hostilidade latente contra as tropas internacionais”, frisa o canadense Lemay-Hébert.

Epidemia de cólera

O ápice aconteceu em 2010. A ONU ampliou mais uma vez o mandato da missão após o terremoto devastador de janeiro e até aumentou seu contingente. Aí, em outubro, surgiu uma epidemia de cólera. Ao menos 600 mil pessoas ficaram doentes, e entre 8 mil e 10 mil morreram.

Logo após o início da epidemia surgiu a suspeita de que o vírus teria se originado do campo dos capacetes azuis nepaleses. Apesar de, um ano depois, uma comissão da ONU ter confirmado a suspeita, e outros especialistas terem concluído que o surto poderia ter sido evitado com medidas simples de prevenção, a ONU até hoje não reconheceu sua culpa. “A ONU prefere mencionar as precárias condições de higiene para se furtar da responsabilidade”, sublinha Lemay-Hébert.

Somente no fim de 2016, o ex-secretário-geral Ban Ki-moon pediu vagas desculpas pelo “papel” das Nações Unidas na tragédia e prometeu reparação, cujo tamanho e forma, até hoje, não estão claros. Com certeza as indenizações não chegarão ao total de 2,2 bilhões de dólares pedidos à ONU, em 2013, por meio de processos impetrados por associações de vítimas. E Lemay-Hébert também considera improvável indenizações individuais, como as vítimas exigem.

Se a ONU algum dia decidir pagar reparações por causa da epidemia de cólera, o dinheiro provavelmente será gerenciado de forma coletiva e investido na construção de escolas e hospitais. Porém, no caso de um país completamente arruinado, isso seria apenas uma gota d’água no oceano.

Repensar as missões de paz

Afinal, no que diz respeito ao Haiti, Lemay-Hébert e Lange concordam que falta um judiciário que funcione, estabilidade política e – até hoje – segurança. “Sim, eu vi policiais”, afirma Lange, “mas seguramente eles estão apenas nos locais onde diplomatas ou organizações estrangeiras estão estacionados.”

A avaliação de Lemay-Hébert não é muito mais positiva. “Sem os capacetes azuis, o governo de transição teria sido vítima da onda de violência após o golpe de Estado”, opina. A estabilização estrutural de longo prazo falhou amplamente. A polícia, pelo menos, está melhor equipada do que no passado.

Lemay-Hébert diz que, como consequência, as Nações Unidas deveriam reavaliar suas operações internacionais. Para ele, a Minustah mostrou que, em se tratando de missões de paz, “mais” não significa “melhor”.

Ele diz que “as consequências indesejadas de missões de paz e da ajuda ao desenvolvimento” se manifestaram na Minustah de forma muito mais clara do que em qualquer outra missão da ONU, e é preciso analisar exatamente como a presença de milhares de funcionários da ONU e de organizações não governamentais pode causar impactos na vida da população local: o aumento dos preços de imóveis em Porto Príncipe já é uma realidade.

O país está diante ainda de uma fuga de cérebros.

“Quando a caravana humanitária partir, os haitianos que forma qualificados, que trabalharam nos projetos, deixarão o país em massa”, diz Lemay-Hébert, acrescentando que, se a missão no país deixou algum legado, este seria que “a Minustah força a ONU a debater, de uma perspectiva completamente nova, as consequências indesejadas das missões de paz”.

Críticas

Já a Rede Jubileu Sul (que envolve entidades como o Centro de Estudos Bíblicos, a Pastoral Social da Confederação Nacional dos Bispos do Brasil, o Conselho Nacional de Igrejas Cristãs, a Auditoria Cidadã da Dívida Pública e a Rede Brasil sobre Instituições Financeiras) faz um balanço crítico. Para a rede de entidades, a Minustah não cumpriu seus objetivos de restabelecer as instituições haitianas e ainda foi marcada por casos de violações de direitos humanos.

O fim da Minustah já vem tarde. Há várias denúncias neste sentido de mulheres violentadas ou levadas à prostituição. Inclusive há filhos de agentes da força de paz não reconhecidos. Outro problema foi a entrada por soldados do vírus que gerou uma epidemia de cólera, com 300 novos casos por semana”, opina Rosilene Wansetto, coordenadora da Rede.

Fonte: Com informações de Jonas Valente para Agência Brasil, 16/10/2017, e Deutsche Welle para Carta Capital, 17/10/2017.

Foto de capa: Wikimedia Commons

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